Publicado em Livros, Reflexões

Hans Kelsen, a Bíblia e a Mortalidade da Alma

Hans Kelsen, nascido em Praga (1881), de família judaica, tornou-se um dos mais importantes juristas do século XX. Seu pensamento muito contribuiu para moldar vários institutos jurídicos que caracterizam hoje o Estado Democrático de Direito. Da imensa lista dos trabalhos que publicou, entre livros e artigos, a obra que mais se destaca é Teoria Pura do Direito, que se tornaria a teoria jurídica mais influente do século passado.

No livro menos conhecido O que é Justiça? – A Justiça, o Direito e a Política no espelho da ciência (Martins Fontes, 1997), Kelsen separa um dos primeiros capítulos para lidar com a ideia de justiça nas Escrituras. Muito do que escreve ali representa obviamente mais uma interpretação pessoal de uma leitura parcial da Bíblia do que a exposição organizada do ensino dela própria sobre determinados temas. Um dos trechos, porém, que chama a atenção pela coerência e aproximação com a doutrina bíblica sistematizada é o que trata da mortalidade da alma (p. 56-59, os itálicos são originais):

Nenhuma crença na imortalidade da alma. A missão do Messias era realizar a justiça neste mundo.16 Essa justiça não era concebida como retribuição exercida em outro mundo sobre as almas imateriais e imortais dos homens após a morte. Tal idéia – pelo menos originalmente – era impossível entre os judeus da Palestina. Pois, entre eles, prevalecia a visão de que o corpo e alma estão inseparavelmente ligados, de tal modo que a idéia de uma alma vivendo sem o seu corpo era-lhes estranha.17 A crença de que a alma continua a existir após a dissolução do corpo não é ensinada em nenhuma parte do Antigo Testamento; é diretamente rejeitada em Jó 14, 10 ss. e nos Salmos 27,13; 49, 12, 20; 88, 10 ss., e é vista com ceticismo no Eclesiastes 3, 21. Quando os profetas ou os salmistas falam da alma ou espírito do homem, referem-se à vida ou ao homem vivo. […] No Antigo Testamento, prevalecia a idéia de que os mortos existem no Xeol (Números 16,33), um lugar de escuridão e pó, de que os mortos estão “dormindo” lá, sem vida, trabalho, subsistência ou conhecimento reais (Lamentações 3,6; Jó 10,22; 14,12; Eclesiastes 9,10). O Xeol é a generalização do túmulo. […]

A crença na ressurreição dos mortos. Embora não houvesse nenhuma idéia de justiça no Xeol, havia, não obstante, uma crença na justiça de Deus a ser realizada após a morte. O instrumento dessa crença não era a idéia da imortalidade da alma, mas a idéia da ressurreição do corpo. Como não havia nenhuma crença na existência de uma alma imortal, não se podia imaginar a ansiada justiça realizada em outro mundo, um mundo transcendental. Era concebida como sendo realizada neste mundo, pelo  juízo final que inaugura o reino messiânico a ser estabelecido sobre a terra. A crença na ressurreição do corpo era um elemento essencial dessa concepção.22

Pelo que estas passagens sugerem, Hans Kelsen se sentiria à vontade para aceitar, ou quem sabe conduzir, um estudo bíblico sobre o estado dos mortos. Ele “dormiu” em 1973. Terá ele aceitado um dia “a ressurreição e a vida”?

“Disse-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá.” João 11:25. Além de mostrar mais uma vez a natureza mortal da alma (o ser humano), essa promessa de Jesus aponta para a única solução real para a morte: a ressurreição.

“Vem a hora em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz. E, os que fizeram o bem, sairão para a ressurreição da vida; e, os que fizeram o mal, para a ressurreição da condenação” (João 5:28-29)

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